sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Análise de Música: Trist - Stíny



Stíny é 3ª faixa do primeiro álbum da banda tcheca Trist. Lançado pela Insikt e limitado a 300 cópias em formato K-7, no ano de 2006. Esta música compartilha o mesmo título do álbum. Ainda nesse mesmo ano foi lançado, como uma demo, Stíny, de forma independente. No entanto, essa demo traz as músicas do álbum no formato instrumental. A banda fundada por Jan Šincl, no ano de 2003, na cidade de Olomouc, Morávia, no leste da República Tcheca, iniciou-se como um projeto pessoal e, ao longo dos lançamentos, vários músicos foram convidados a participar tanto nas gravações em estúdio quanto para acompanhar a banda em apresentações ao vivo. Ele tinha apenas 14 anos quando fundou a banda. A palavra "trist" se traduz como "deprimente" em norueguês, catalão e alemão. A atmosfera das músicas é uma expressão de "desespero e anseio pela morte". As letras abordam a melancolia, a dor de existir, a solidão, negatividade, desespero, angústia e desejo pela morte. Stíny segue uma cadência bastante mórbida, com poucas variações no ritmo. As guitarras ecoam riffs minimalistas, os vocais são angustiados e encobertos pela instrumentação fria, as linhas de bateria se alternam vagamente, ainda assim, se mantém marcantes.

Zasnezhennyy put' k mertvoy teni kladbishcha,
put' k tumanu chernoy nochi.
(Uma trilha de neve até o cemitério de sombras mortas,
uma trilha na névoa de uma escura noite.)

A letra é narrada em 3ª pessoa. Fala sobre um local, um cemitério, onde seres ofuscados, sem qualquer chama de alegria, foram enterrados. O próprio local tem uma aparência sombria e está em meio a neve, gerando uma atmosfera mais gelada e lúgubre sentida por um possível visitante.

Zdes' vstrechayutsya tol'ko teni i vse grustnyye, padshiye.
Derev'ya plachut svoimi pokhoronnymi aromatami.
(Aqui se encontram apenas as sombras, os tristes e os arruinados.
As árvores lamentam com seu perfume de funeral.)

Neste local estão enterradas pessoas, que em vida, padeceram de grande sofrimento, foram rejeitadas, soterradas na solidão, afogadas em angústias e desesperanças. Seres desprovidos de alegria e qualquer boa sensação. Estas pessoas foram lançadas à morte física mas, enquanto vivas, já sentiam-se mortas. O local é cercado pelas sombras da noite, pela baixa luminosidade. Está entregue à mais densa escuridão, onde mesmo as árvores se rendem ao clima soturno que o abarca. Elas exalam seus fúnebres odores, completando o profundo pesar que assola o lugar.

Region bez ogney, beskonechnaya t'ma u zhalkikh pamyatnikov,
Boleznennyye rany yadovitykh shipov krasnykh oblakov.
(Uma região sem luz, a escuridão é infinita sob deploráveis lápides,
Feridas dolorosas por espinhos venenosos abaixo das nuvens de sangue.)

A escuridão toma todo o local que abriga aqueles que adormecem sob um sono eterno. No entanto, é notável a indiferença por parte de entes próximos daqueles que ali descansam. As lápides são tomadas pelo descaso, sendo engolidas pelas marcas do tempo. Essas visões expressam como aquelas pessoas, ali sepultadas, foram completamente esquecidas. Isso machuca como espinhos venenosos que rasgam a pele, intoxicam cada célula do corpo e banham a terra em sangue.

Nado mnoy kruzhit bol'naya ptitsa, poyushchaya mrachnuyu pesnyu o melankholii.
Kladbishche palomnikov, zabytyy mir nochnoy chernoty.
(Um pássaro deprimido circula sobre mim cantando uma sombria canção sobre a melancolia.
Cemitério dos vagantes deprimidos, os esquecidos na escuridão da noite.)

A atmosfera, fechada em luto e mágoas, se torna mais densa com os pássaros, ao redor, observando enquanto empoleirados em obscuras árvores. Alguns sobrevoam o cemitério, enquanto dão vazão aos seus cantos lamuriosos. O clima se torna ainda mais triste e sombrio. A solidão impera o local e evidencia que ali jazem os esquecidos, não apenas após a morte, mas os mesmo já ofuscados em vida, os invisíveis, aqueles negados enquanto ainda respiravam. 

Dorozhki bez yedinoy zazhzhennoy svechi,
Staryye nadgrobiya utonuli v snegu, nichego velichestva
Kladbishche mertvykh teney, kladbishche zhizni.
(Caminhos sem uma única chama de luz,
Antigas lápides soterradas na neve, nada grandiosas
Cemitério das sombras mortas, cemitério da vida.)

A escuridão do lugar se completa com a desolação daqueles que ali se encontram. Não há luz - literalmente falando - e nem qualquer luz que se eleve daqueles que ali foram esquecidos. Suas vidas foram encadeadas em plena escuridão e tristeza. Não há qualquer lembrança aquecedora, ou uma memorável chama de luz, que traga uma faísca de vida ao local. Os túmulos foram tomados pela neve, as lápides com nomes foram engolidas pelos flocos gélidos, e o esquecimento absorve tudo. É o local das sombras mortas, de seres esquecidos, de seres desprovidos da chama da vida mas, sobretudo, o local onde residem as mesmas mentes, que durante suas dolorosas existências, já eram assoladas pelo inverno chamado solidão. Não houveram mudanças de um estado para outro. Vivos ou mortos, o esquecimento, por parte das pessoas próximas, permaneceu, de qualquer modo.

Trist tem como característica marcante a combinação de uma atmosfera densa enevoada e angustiante. Os vocais ficam sufocados pela parede instrumental densa e melancólica que se forma. Isso traz mais expressividade sobre a dor sufocante que agride cada indivíduo acorrentado à dor de existir. Seus vocais imersos em desolação se ajustam perfeitamente ao clima gerado na música. A letra traz à tona as feridas de ser esquecido, de ser abandonado, de ser apagado com a borracha da indiferença. As pessoas, em suas bolhas egocêntricas, simplesmente, dispensam umas às outras como se fossem descartáveis. Lançam umas às outras em aterros do esquecimento e, trazem à luz da realidade, a máxima da existência: nascemos sozinhos, morremos sozinhos. Trist foi uma banda - ou projeto - que expressou, majestosamente, através de suas canções, toda essa solidão que abarca os seres humanos, quer queira vivos, quer queira mortos. 

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