sexta-feira, 28 de fevereiro de 2020

Lamúria Abissal


Lamúria Abissal é uma banda formada por Iuri Calado 'Thy Despair', também conhecido como 'Reverand Despair', nos vocais/letras e Caio Ramon 'Pale' em todos os instrumentos, no Rio de Janeiro, Brasil, no ano de 2011. Ambos já amigos desde a infância. Nas palavras de Thy Despair, o nome da banda expressa "o lamento daqueles que nunca viram a luz da vida, ou qualquer que seja". Logo na primeira demo é captado isso, lamúrias vindo do mais obscuro abismo interior. As letras remetem toda a fadiga e exaustão de sobreviver diante de uma miserável existência. As decepções diante de qualquer relacionamento com os seres humanos, os rompimentos de laços alicerçados em confianças - facilmente quebradas por uma das partes - o peso de sobreviver em meio à rejeição e negação da vida e, como tudo isso cansa fisica e mentalmente o indivíduo. As buscas de aliviar a dor são sempre momentâneas e, por fim, só geram mais frustrações.
Com a sonoridade bruta, pouco lapidada porém com riffs marcantes, vocais intensos com muito sofrimento, letras que remetem sair do fundo de um peito dilacerado pela vida, seguindo com uma coesão ímpar que se arrastou por todos os trabalhos posteriores, marcou a demo Cânticos de Um Além Abismo que foi lançada, em fevereiro de 2012, pelo selo Depressive Illusion Records, em 100 cópias no formato K-7. Neste mesmo ano, esta demo veio a ser relançada pelo selo Rigorism Production com edição limitada de 50 cópias em CD. A arte da capa foi feita por Fernando Count Old (que lidera projetos como Old Throne, Anti-Life, Count Old e Neblina Suicida). Apesar de ser chamada de demo, soa muito mais do que uma mera demonstração. A qualidade é impressionante.
Em outubro de 2012 o primeiro álbum é lançado pela Rigorism Production. O Último Descanso Finalmente lhe é Concedido traz uma intensidade similar à demo, acrescido de um caos dos mais profundos e destrutivos sentimentos humanos. O instrumental soa ríspido mas bastante impactante, com guitarras corrosivas que criam uma atmosfera perfeita para as letras com emoções autênticas e que são verdadeiros poemas. Letras que se mantém com influências do ultra-romantismo, um movimento do século XIX de língua portuguesa conhecido por ser obscuro e autodestrutivo. As temáticas envolvem decepções, rejeições, vazio existencial, ódio, dor, sofrimento, isolamento, fadiga mental, depressão, suicídio e morte. A capa do álbum é a fotografia do suposto fantasma do Sanatório de Waverly Hills, em Louisville, Estados Unidos. Segundo as lendas, a imagem é do espectro da enfermeira que teria cometido suicídio e que pode ser visto vagando pelos corredores do hospital. Deixando de lado as histórias paranormais, o fato é que capa remete muito bem o obscuro, o desconhecido, a insanidade, o pavor de viver, sobreviver ou meramente existir. A faixa de abertura, Amado Ódio Retroativo, se inicia apenas com uma guitarra pouco distorcida soando um riff que, logo, dá vazão para todos os outros instrumentos se juntarem. Os vocais de Thy Despair são profundamente desoladores e transmitem sentimentos de fúria com uma dor que não se pode sanar de jeito algum. Os riffs de guitarra são hipnóticos e se fixam facilmente na mente do ouvinte. A bateria segue em ritmo direto mas se mescla perfeitamente aos demais instrumentos. Faltando cerca de dois minutos antes da canção encerrar, ela reduz o peso e uma guitarra entra solando de forma muito melancólica e, novamente, é preenchida pelos vocais e lamúrias de Thy Despair. Me Afogando em Lâminas e Comprimidos se incia com alguns acordes limpos de guitarra que são sobrepostos, logo em seguida, pelos outros instrumentos. Segue a mesma linha de peso e desolação da faixa anterior. A letra fala do ódio que envolve o eu lírico, que se cansou de tudo ao seu redor, das noites e dos dias, das pessoas e seus abandonos. Há pequenas partes de vocais limpos e chorosos se alternando com os guturais rasgantes. O Fantasma de um Rancoroso Passado se inicia com um denso teclado já transmitindo o que vem pela frente, o instrumental mais rápido entra mas o teclado se mantém mais lento e penetrante como se cortasse lentamente e profundamente a carne. Os vocais atormentados se alternam com cantos limpos. A letra, embora triste, transmite certa resignação que o eu lírico está buscando para aceitar o inevitável fim das relações pessoais bem como o fim de tudo na vida. A música que leva o nome da banda, Lamúria Abissal, se inicia com o trecho do filme brasileiro Morte e Vida Severina. A sonoridade é arrastada e bastante melancólica. É a música mais longa do álbum, com pouco mais de 14 minutos. E, embora seja longa, no meio dela há uma redução do tempo sonoro e um riff limpo de guitarra ecoa juntamente com os berros e urros de dor por parte de Thy Despair que, logo em seguida, começa a recitar com vocais limpos. Essa quebra sonora se encaixou perfeitamente pois não deixa a canção tediosa ao ouvinte. O trecho "Não existe, quem me odeie mais, do que o nojo, que sinto de mim mesmo" expressa a mensagem de auto-ódio que a banda procura gerar neste álbum. ...de uma Profunda e Cancerígena Melancolia encerra o álbum com o mesmo peso inicial. Riffs de guitarras se repetem e criam uma densa e triste atmosfera que impregna na mente do ouvinte e não sai mais. A letra é um expurgo da mais profunda dor enraizada nos confins da mente do indivíduo. A escuridão soterrou toda luz que poderia o levar a um caminho menos doloroso. As decepções com as pessoas e consigo mesmo vem à tona de forma crua. Não há mais vontades, não há mais anseios, não há coisa alguma a não ser a melancolia que, assim como um câncer, devora toda carne ao redor, devora todos seus dias. O seu amanhã já foi entregue ao vazio mais aterrorizante que possa existir. A desolação o consome internamente enfraquecendo cada célula de seu fatigado corpo. Os questionamentos existenciais são vomitados aos ventos frios que jamais trarão qualquer resposta. A dor, apenas a mais profunda e pungente dor, é a resposta inerente à existência. Ao ser lançado no abismo as chances de retornar à superfície são, severamente, aniquiladas. Solidão, trevas e dor, isso é tudo que há para sentir e enxergar, isso é tudo que se pode contemplar quando se está para além do abismo, para além das lamúrias abissais. Faltando cerca de 3 minutos antes de encerrar a canção, Thy Despair faz um breve discurso, um desabafo, que é acompanhado por sons de chuva e, em seguida, um riff limpo de guitarra é executado, majestosamente, por Pale até que a canção completamente se desvaneça
Em março de 2014 é lançado, pela No Remorse Records, o split Spilled into This Disgrace of World, na plataforma de música digital bandcamp, junto com a banda Born an Abomination. A música Esmorecido Solstício da Morte se inicia com uma suave melodia que segue com guitarras rasgantes e vocais já marcantes de Thy Despair. Ela se alterna com riffs de piano mas sem alterar a estrutura densa e depressiva construída. Ex Nihilo Nihil Fit é um ode ao niilismo, com uma sonoridade fúnebre composta por um piano e por uma guitarra sem distorção, a letra é recitada e fala sobre o Nada e a aceitação da morte, a única experiência real da vida.
Em abril de 2016 é lançado o EP Passagem para o Além Abismo, na plataforma digital bandcamp. E, no mês de julho, é lançado em CD limitado a 50 cópias, pelo selo Cvlminis. As músicas mantém o pêndulo entre uma sonoridade parte calma com uso de teclados, alternando com um peso brutal de guitarras agonizantes e vocais de puro ódio e sofrimento. Estupor de Viver mantém mais vocais limpos mas sem perder o sentimento de desolação característico de Thy Despair. Um som simbila pela música como se fosse um pendulo e reflete bem a mensagem da letra e do próprio título, o tempo paralisa, anos e mais anos nas mesmas lamúrias, nas mesmas dores e angústias que nunca cessam. Orquídea Sangrenta segue uma linha similar a anterior, com um piano minimalista e hipnotizante. Lavrando Defuntos se inicia com o trecho do filme Morte e Vida Severina e, em seguida, uma bateria começa marchar, tendo um teclado como pano de fundo, apenas para abrir lugar ao peso que vem em seguida. Em Solidão, a introdução usada é de um trecho do filme Donnie Darko que fala sobre a solidão que nos amedronta, quer queiramos ou não. Um riff limpo de guitarra entra e a bateria cadenciada mantém a estrutura para os vocais agonizantes. A música avança com o peso característico da banda. O trecho "Esse mundo é lugar para outros, não pertenço aqui, tão pouco aos que aqui habitam , não posso contar com os outros", expressa muito bem o sentimento de vazio e solidão que envolve o eu lírico e que, por fim, recai sobre cada ser humano que segue em seu próprio mundo de devastador silêncio. O álbum fecha com um cover, muito bem interpretado, de Eternal Beauty of Trees da banda chilena de folk doom Uaral.
Em julho de 2017 é lançado, digitalmente, pelo selo Order Noktondurner o split A Rainha é Sempre Impecável, com as bandas NuktruktРаскаянье. As faixas Anestesia e Excelsiori trazem uma sonoridade um pouco diferente dos trabalhos anteriores, mas sem perder a essência e as características que fazem a banda ser tão singular.
Em outubro de 2017 é lançado o álbum Eterno Outono da Alma, pela Sinistrion Distro. A evolução sonora aqui é bastante perceptiva, as guitarras soam mais claras, mesmo distorcidas, a bateria mantém maior velocidade mas sem deixar de ser cadenciada, uma linha melódica pela guitarra se estende por algumas músicas, resultando em um instrumental tão expressivo quanto a parte lírica. Os vocais desoladores continuam como antes, precisos e gerando a atmosfera perfeita para uma viagem dentro do abismo que assola o ouvinte. O uso de teclados é maior neste álbum, seja nas introduções ou em interlúdio das músicas. As letras abordam a decadência humana, a dor e sofrimento que, como uma árvore, possui suas raízes profundas. Comparado ao álbum anterior, há bastante mudanças mas, entre esses dois álbuns, existem lançamentos que interligam essa evolução e só mostram como a banda segue fazendo um ótimo trabalho através dos anos.
A banda é uma forte representante do Depressive Black Metal no país, com a característica de cantar músicas no próprio idioma. Possuem uma significativa quantidade de fãs no meio underground do metal negro brasileiro. Também foi, e ainda é, grande influencia para outros projetos e bandas de DSBM no país.
Pale tem o projeto neoclassical Pale's Winter, o de brutal death metal Leviathan Necrosis e o de dark experimental/ambient .rar. Também faz parte das bandas Candeliere e Hatend.
Thy Despair faz parte das bandas Cursedflesh e Ensimesmamento. Também, fez os vocais da canção Wind da banda brasileira Help.
Já foi cogitada apresentações ao vivo da Lamúria Abissal por todo o país mas, por enquanto, nada foi confirmado.
No dia 16 de abril de 2019 foi postado uma nota, na página oficial da banda no facebook, expressando agradecimento aos fãs e relatando o hiato em que a banda entraria dali em diante, sem data prevista para um retorno ou lançamento de novas músicas.

Discografia:
Cânticos de Um Além Abismo "Demo" (2012)
O Último Descanso Finalmente lhe é Concedido (2012)
Spilled into This Disgrace of World "Split" (2014)
Passagem para o Além Abismo "EP" (2016)
A Rainha É Sempre Impecável "Split" (2017)
Eterno Outono da Alma (2017)

Membros:
Thy Despair - Vocais (2011 - 2019)
Pale - Todos os instrumentos (2011 - 2019)

sábado, 22 de fevereiro de 2020

Ofdrykkja - I Skuggan av Mig Själv [vídeo-legenda PT-BR]



Esta música havia sido legendada há alguns anos e o vídeo estava hospedado no canal Depressedy. Infelizmente, devido às novas regras e diretrizes do youtube, o vídeo foi removido por, segundo o site, possuir conteúdo nocivo e perigoso. Não haviam cenas no vídeo, apenas imagens para criar uma certa dinâmica conforme a letra da música fosse aparecendo. De todo modo, ele foi excluído. E, infelizmente, alguns dias depois mais vídeos foram removidos e culminou com a remoção permanente do próprio canal. Então, disponho aqui, novamente, esta música legendada em um novo vídeo, neste há cenas dos membros da banda, antes do lançamento do primeiro álbum. São cenas de gravações caseiras e pessoais, onde os 3 membros: Pessimisten, Drabbad e The Associate (Bödeln não estava presente pois se encontrava hospitalizado, mas já havia gravado todas as suas partes de bateria no álbum) estão consumindo álcool, fazendo uso de Diamorfina e se automutilando. Pessimisten se corta, severamente, e seu sangue flui em grande quantidade. Este mesmo local, sua residência, foi o cenário para a fotografia que ilustra a capa do álbum A Life Worth Losing. De frente à entrada de seu quarto, ele registra uma fotografia onde é possível ver parte de sua cama com manchas de sangue bem como o chão marcado pelo mesmo fluído. 
A banda Ofdrykkja foi formada em Västerås, Suécia, no ano de 2012. Com Drabbad na guitarra e vocais de apoio e Pessimisten nos vocais principais. Algum tempo depois, The Associate e Bödeln se juntaram a ela, o primeiro na posição de pianista e o segundo como baterista. Ofdrykkja significa "beber em excesso", na língua nórdica arcaica e explica muito bem o tema das letras e o quanto, as experiências pessoais dos membros, influem na banda. A temática envolve, principalmente, drogas lícitas e ilícitas - como válvulas de escape da dura realidade -, bem como overdose por medicamentos psiquiátricos, bebida alcoólica, desolação, misantropia e solidão em meio à vida urbana. As letras demonstram quanto o indivíduo busca por algo que amenize suas dores mentais e físicas, o seu vazio existencial ou, mesmo, uma maneira fugaz de sair da realidade, ainda que, seja uma opção momentânea.
Drabbad iniciou contato com Pessimisten e logo começaram a trocar conversas. Drabbad havia saído da banda Lepra, há pouco tempo, e Pessimisten havia sido membro da banda Apati até seu encerramento. Nesta banda ele era conhecido como C9H13N. Após a morte de seu amigo e parceiro de banda Obehag, ele com os demais integrantes resolveram encerrar a Apati. Ofdrykkja, apesar das fortes influências do Black Metal sempre citadas pelos membros, tem uma sonoridade que se enquadra ao Depressive Rock/Narcotic Metal, com melodias melancólicas, depressivas, tristes e que falam da dor de viver e quão necessário é, às vezes, optar por meios de se desligar, momentaneamente, da realidade. A fala é usada em algumas músicas, bem como os vocais limpos, mas são os vocais chorosos que trazem uma tristeza ímpar às canções da banda. Canções essas que são compostas com os sentimentos mais sinceros possíveis.
A Life Worth Losing foi lançado em abril de 2014, pelo selo musical Temple of Death Productions, e limitado a 50 cópias em K-7. I Skuggan av Mig Själv, que trago legendada neste vídeo, é a 3ª faixa do álbum. Ela traz uma profunda e triste melodia de guitarra que percorre a música toda. Esse efeito usado na guitarra solo marca a maioria das músicas deste álbum e gera algo bastante singular à banda, sendo uma marca da mesma. Os vocais, que combinam gritos ofegantes que beiram o choro com os de dor e desolação, são outra característica encontrada neste material. A letra é um desabafo de alguém que não se enxerga mais como ser humano. O cansaço, de seguir sobrevivendo com uma ansiedade massacrante, o consome sem pausa. Quanto mais se tenta sair desse abismo, mais energia é perdida nessas tentativas de lutar contra uma dor que ultrapassa a própria carne. Tudo passa a causar incomodo. Um misto de angústia com ódio se fundem. Ódio por acordar todos os dias, por estar paralisado na própria dor, por olhar a sua volta e não enxergar ninguém, nada em que possa se apoiar. E, esse ódio, como alimento denso, pesa mais e mais a cada dia. O indivíduo tenta sair, andar por aí, sem rumo, sem destino mas, tudo acaba por piorar sua sanidade. Até mesmo as folhas, que são levantadas do chão pelo vento frio do outono, geram uma sensação terrível e alimentam suas já demasiadas paranoias. Mais temores se somam aos seus mais obscuros medos. Ao caminhar em meio à multidão, seu ódio se torna ainda mais agressivo. O mundo é um tormento. As pessoas são uma escória nadando em seu próprio egoísmo. Ele olha para elas com uma face deformada em raiva, aversão, ódio e, deseja profundamente, que alguma delas olhe para ele com desdém para que, assim, ele tenha um gatilho, um motivo, um estopim para explodir em fúria e atacar esta pessoa. Ele não mede as consequências, não pensa que alguma dessas pessoas poderia revidar e o machuca-lo, antes dele a machucar, porque, na verdade, nada mais importa. Sua integridade física não tem qualquer importância, ele já está destruído de dentro para fora. A exaustão física e mental chegam ao limite. Ao retornar para sua casa, o único lugar que ainda o priva do mundo, ele reflete quão sufocante seus dias se tornaram. Ele não se percebe como um humano, ao olhar para si só pode ver uma figura inumana, um monstro, um fantasma, uma aberração, deformada em angústias, temores e auto-ódio. Por dentro, o frio o petrifica, o imobiliza. Não há mais emoções que possam aquecer. Não há mais paixões. Ele não consegue gostar de coisa alguma, não consegue direcionar qualquer sentimento de afeto por alguém. A ansiedade desfigurou sua face, seus sentimentos, suas paixões. Isso tudo o maltrata, o faz se sentir como um zumbi, um morto-vivo. Imerso em pensamentos destrutivos, ele alcança sua mochila e encontra uma garrafa de vinho, numa última esperança de se aquecer, perante o frio da solidão, toma alguns goles da bebida e, tomado pela mais cruel constatação, conclui dizendo a si mesmo que aquilo será o mais próximo do amor que ele poderá sentir.

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Análise de Música: Trist - Stíny



Stíny é 3ª faixa do primeiro álbum da banda tcheca Trist. Lançado pela Insikt e limitado a 300 cópias em formato K-7, no ano de 2006. Esta música compartilha o mesmo título do álbum. Ainda nesse mesmo ano foi lançado, como uma demo, Stíny, de forma independente. No entanto, essa demo traz as músicas do álbum no formato instrumental. A banda fundada por Jan Šincl, no ano de 2003, na cidade de Olomouc, Morávia, no leste da República Tcheca, iniciou-se como um projeto pessoal e, ao longo dos lançamentos, vários músicos foram convidados a participar tanto nas gravações em estúdio quanto para acompanhar a banda em apresentações ao vivo. Ele tinha apenas 14 anos quando fundou a banda. A palavra "trist" se traduz como "deprimente" em norueguês, catalão e alemão. A atmosfera das músicas é uma expressão de "desespero e anseio pela morte". As letras abordam a melancolia, a dor de existir, a solidão, negatividade, desespero, angústia e desejo pela morte. Stíny segue uma cadência bastante mórbida, com poucas variações no ritmo. As guitarras ecoam riffs minimalistas, os vocais são angustiados e encobertos pela instrumentação fria, as linhas de bateria se alternam vagamente, ainda assim, se mantém marcantes.

Zasnezhennyy put' k mertvoy teni kladbishcha,
put' k tumanu chernoy nochi.
(Uma trilha de neve até o cemitério de sombras mortas,
uma trilha na névoa de uma escura noite.)

A letra é narrada em 3ª pessoa. Fala sobre um local, um cemitério, onde seres ofuscados, sem qualquer chama de alegria, foram enterrados. O próprio local tem uma aparência sombria e está em meio a neve, gerando uma atmosfera mais gelada e lúgubre sentida por um possível visitante.

Zdes' vstrechayutsya tol'ko teni i vse grustnyye, padshiye.
Derev'ya plachut svoimi pokhoronnymi aromatami.
(Aqui se encontram apenas as sombras, os tristes e os arruinados.
As árvores lamentam com seu perfume de funeral.)

Neste local estão enterradas pessoas, que em vida, padeceram de grande sofrimento, foram rejeitadas, soterradas na solidão, afogadas em angústias e desesperanças. Seres desprovidos de alegria e qualquer boa sensação. Estas pessoas foram lançadas à morte física mas, enquanto vivas, já sentiam-se mortas. O local é cercado pelas sombras da noite, pela baixa luminosidade. Está entregue à mais densa escuridão, onde mesmo as árvores se rendem ao clima soturno que o abarca. Elas exalam seus fúnebres odores, completando o profundo pesar que assola o lugar.

Region bez ogney, beskonechnaya t'ma u zhalkikh pamyatnikov,
Boleznennyye rany yadovitykh shipov krasnykh oblakov.
(Uma região sem luz, a escuridão é infinita sob deploráveis lápides,
Feridas dolorosas por espinhos venenosos abaixo das nuvens de sangue.)

A escuridão toma todo o local que abriga aqueles que adormecem sob um sono eterno. No entanto, é notável a indiferença por parte de entes próximos daqueles que ali descansam. As lápides são tomadas pelo descaso, sendo engolidas pelas marcas do tempo. Essas visões expressam como aquelas pessoas, ali sepultadas, foram completamente esquecidas. Isso machuca como espinhos venenosos que rasgam a pele, intoxicam cada célula do corpo e banham a terra em sangue.

Nado mnoy kruzhit bol'naya ptitsa, poyushchaya mrachnuyu pesnyu o melankholii.
Kladbishche palomnikov, zabytyy mir nochnoy chernoty.
(Um pássaro deprimido circula sobre mim cantando uma sombria canção sobre a melancolia.
Cemitério dos vagantes deprimidos, os esquecidos na escuridão da noite.)

A atmosfera, fechada em luto e mágoas, se torna mais densa com os pássaros, ao redor, observando enquanto empoleirados em obscuras árvores. Alguns sobrevoam o cemitério, enquanto dão vazão aos seus cantos lamuriosos. O clima se torna ainda mais triste e sombrio. A solidão impera o local e evidencia que ali jazem os esquecidos, não apenas após a morte, mas os mesmo já ofuscados em vida, os invisíveis, aqueles negados enquanto ainda respiravam. 

Dorozhki bez yedinoy zazhzhennoy svechi,
Staryye nadgrobiya utonuli v snegu, nichego velichestva
Kladbishche mertvykh teney, kladbishche zhizni.
(Caminhos sem uma única chama de luz,
Antigas lápides soterradas na neve, nada grandiosas
Cemitério das sombras mortas, cemitério da vida.)

A escuridão do lugar se completa com a desolação daqueles que ali se encontram. Não há luz - literalmente falando - e nem qualquer luz que se eleve daqueles que ali foram esquecidos. Suas vidas foram encadeadas em plena escuridão e tristeza. Não há qualquer lembrança aquecedora, ou uma memorável chama de luz, que traga uma faísca de vida ao local. Os túmulos foram tomados pela neve, as lápides com nomes foram engolidas pelos flocos gélidos, e o esquecimento absorve tudo. É o local das sombras mortas, de seres esquecidos, de seres desprovidos da chama da vida mas, sobretudo, o local onde residem as mesmas mentes, que durante suas dolorosas existências, já eram assoladas pelo inverno chamado solidão. Não houveram mudanças de um estado para outro. Vivos ou mortos, o esquecimento, por parte das pessoas próximas, permaneceu, de qualquer modo.

Trist tem como característica marcante a combinação de uma atmosfera densa enevoada e angustiante. Os vocais ficam sufocados pela parede instrumental densa e melancólica que se forma. Isso traz mais expressividade sobre a dor sufocante que agride cada indivíduo acorrentado à dor de existir. Seus vocais imersos em desolação se ajustam perfeitamente ao clima gerado na música. A letra traz à tona as feridas de ser esquecido, de ser abandonado, de ser apagado com a borracha da indiferença. As pessoas, em suas bolhas egocêntricas, simplesmente, dispensam umas às outras como se fossem descartáveis. Lançam umas às outras em aterros do esquecimento e, trazem à luz da realidade, a máxima da existência: nascemos sozinhos, morremos sozinhos. Trist foi uma banda - ou projeto - que expressou, majestosamente, através de suas canções, toda essa solidão que abarca os seres humanos, quer queira vivos, quer queira mortos. 

sábado, 15 de fevereiro de 2020

Curiosidades

Nachtkrapp em alemão, Nattramnen ou Nattramnar em sueco, e Nattravnen em norueguês se refere a uma ave mitológica presente em várias lendas, principalmente em países europeus. A tradução do termo é "corvo", pois a ave se assemelharia a um corvo e teria o hábito noturno. Segundo as lendas, Nattramn ou Nattramnar, tem a função de transportar as almas de suicidas e, também, de recém-nascidos que morreram sem serem batizados. Porém, ao contrário de outras mitologias e religiões, a ave não conduz as almas para algum lugar de eterna tormenta, pelo contrário, ela conduz para um quarto e canta para a alma da criança, ou para a da pessoa que cometeu suicídio, até que esta adormeça serenamente.

Lifelover foi o nome que Jonas Bergqvist (B) deu à banda que fundou com seu amigo Kim Carlsson. Jonas escolheu o nome Lifelover (Amante da Vida) pois era assim que seu detestável vizinho lhe chamava. Ele contou que, devido ao seu estilo mais soturno e por curtir rock e metal, seu vizinho dizia que ele era um "amante da vida", de forma pejorativa, como se ele fosse uma pessoa imoral e "mundana" devido aos seus gostos. Jonas disse que as pessoas julgam superficialmente as demais sem, de fato, se aprofundarem ou buscarem conhecer o outro primeiramente. Ele achou que Lifelover ficaria interessante para o nome da banda pois assim as pessoas poderiam chamá-la do que quisessem, como de fato ocorreu em lançamentos futuros com críticas para encaixá-los em gêneros e termos musicais.

H. Suizid e Lord Lokhraed fundaram a Nocturnal Depression e escolheram esse nome pois, segundo os músicos, representa bem os temas abordados nas músicas. Apresentando uma atmosfera atormentada e oprimida, suas letras expressam a luta do indivíduo em meio às suas dores mentais em um mundo desolado. Durante o dia as pessoas tentam, com a pouca energia que possuem, levarem suas rotinas de algum modo mas, à noite, a mente enferma não deixa nada escapar, a máscara usada durante o dia cai e, então, a depressão noturna massacra noite adentro.

Lord Lokhraed nasceu com uma deficiência na mão esquerda, que tem apenas dois dedos grossos remetendo a uma "pata de bode", chamada de Ectrodactilia. Porém, depois de anos sofrendo bullying por tal deformidade, ele passou a usar isso a seu favor, pintando a mão de vermelho e dando uma aparência ensanguentada durante os shows. Na terceira estrofe da música "We're All Better Off Dead" Lokhraed deixa uma mensagem clara para os idiotas que tanto o importunaram.
"Eu nasci com um estigma na mão e uso isso para alimentar o seu ódio
Talvez, você pense em me machucar mas você é uma porcaria humana que eu manipulo"

Sorrow, da banda Austere, disse em uma entrevista que, mesmo sendo um multi-instrumentista, a bateria é o seu instrumento favorito e o que mais gosta de tocar. Seu amigo Desolate, também multi-instrumentista e fundador da banda Austere, fez os vocais de todas as faixas, mais a gravação e a mixagem do álbum "Sorh" da banda Woods of Desolation, também originária da Austrália.

Jan Šincl (Trist) e Kim Carlsson (Hypothermia, Lifelover e Kall) são amigos de longa data e já tiveram um projeto juntos. Life Is Pain foi formada em 2006 e nesse mesmo ano lançou apenas uma demo intitulada Bloody Melancholy, contendo 3 músicas e logo o projeto encerrou-se. Foi uma das primeiras bandas (ou projetos) de DSBM. Kim Carlsson disse que decidiu finalizar pois a Lifelover já estava seguindo os primeiros passos como banda, propriamente dita, e ele queria se dedicar mais a ela. Šincl também acabou se dedicando mais a sua banda Trist, inclusive, ainda em 2006 a banda lançou o álbum Stíny que foi um marco nas características que se tornariam presentes em lançamentos posteriores. Esse álbum foi lançado pelo selo Insikt, selo este do Kim. Ambos disseram que Life Is Pain foi mais uma espécie de união e expressões de dor, melancolia e angústia dos dois músicos e amigos, por isso a produção é bem simples, crua e focada mais em tentar expurgar a desolação que ambos sentiam.

Graf von Baphomet, nome real Давид (David), vocalista da banda Psychonaut 4, trabalha no restaurante PAUL, em Tbilisi, Geórgia, como maître, ou seja, ele gerencia o restaurante. Numa entrevista, ele disse que embora vivencie o que expressa nas letras de suas músicas, obviamente, tem que levar a vida de algum modo, então, faz o que qualquer outra pessoa com depressão costuma fazer, luta contra seus monstros mentais e vai sobrevivendo, como possível.

Aurora Disease é uma banda com pouco tempo de existência mas marcada por tragédias. Começou como projeto solo de Antisozial em 2015, e em 2016 era uma banda com todos os instrumentistas. Já tinham 21 músicas escritas e prontas para começar a gravar mas, de forma súbita, o baixista Samuel morreu. Isso abalou os outros membros que decidiram dar um tempo na música. No ano seguinte, em 2017, quando decidiram retomar a banda e começar a fazer as gravações, o guitarrista Negative morre. Isso foi bastante desolador para os que ficaram. Por fim, o que começou como um projeto de Antisozial acabou voltando a ser um projeto. Ele começou a compor novas músicas e as rotulou como "Urban Depressive Black Metal", refletindo principalmente a vida cotidiana monótona em uma cidade sombria, encharcada de adictos e pessoas com transtornos mentais, sendo essa a realidade de sua própria vida cotidiana e do horror do mundo que nos cerca.

Malvery e Silencer são as duas bandas que podemos chamar de precursoras do que veio a ser conhecido por DSBM, isso porque antes dessas bandas poucas abordavam os temas presentes e característicos do subgênero. Elas foram ao extremo, focando na mais profunda dor e sofrimento humano, mas isso no sentido pessoal, não no geral como o Black e Death Metal fazia (faz). Ambas as bandas uniram a atmosfera densa e sombria apresentada com letras focadas em autoflagelação, suicídio e depressão. Musicalmente, no entanto, Malvery se concentrava numa sonoridade mais próxima do Death Metal, enquanto Silencer do Black Metal, com o uso ocasional de guitarras limpas e linhas de piano. Infelizmente, o fim dessas bandas foi muito rápido. Em 1999, LeChâtier, vocalista do Malvery, suicidou-se. O álbum de estréia do Malvery chamado "Mortal Entrenchment In Requiem", foi lançado postumamente e foi tido como "uma profunda jornada dentro de uma alma atormentada pela depressão e em busca da morte como cura para a dor de viver". Já Nattramn, foi internado em um hospital psiquiátrico na cidade de Växjö, logo após o lançamento do álbum Death - Pierce Me. A banda que, além de Nattramn, tinha Leere como membro, encerrou atividades após esse evento. O álbum Death - Pierce Me foi visto como "expressão pura de dor, depressão e loucura".

I'm In A Coffin já foi alvo de muitas críticas. Formada em 2008, sendo uma época onde poucas pessoas compreendiam a proposta do DSBM, os membros foram agredidos verbalmente por vários "Black metaleiros" na internet. Estes diziam que a banda era uma piada e não poderia ter nenhum rótulo que usasse "black metal". As críticas eram tanto pelos seus pseudônimos "Sad-ist" (algo como Tristelista) e "Adorable" (Adorável), quanto pelos urros e gritos nas músicas que esses críticos julgavam como falsos. Também, sofreram críticas quando, em uma foto promo, Sad-ist apareceu com seu gatinho de estimação no colo. A verdade é que a banda mostrou qualidade logo na primeira demo, onde ambos gravaram as músicas em um quarto, de forma amadora, e seguiram fazendo isso até o primeiro álbum. Os pseudônimos são uma ironia que, inclusive, muitas outras bandas de DSBM também fizeram. Usar humor numa vertente depressiva do metal é, justamente, uma forma de satirizar a própria vida. O gatinho na foto não foi intencional, mas ele se aproximou bem na hora e, obviamente, sendo amante dos animais, Sad-ist o pegou no colo e não se importou dele também sair na foto. Os gritos, urros, lamentos nas músicas foram expressos de forma sincera, não cabe julgar como cada pessoa deve se comportar diante de sua dor e, por isso, cada uma expressa à sua própria maneira, suas dores, no DSBM.

• O nome Xasthur surgiu de duas palavras: Hastur e Xenaoth. Malefic retirou o primeiro nome do livro Necronomicon, escrito por H.P. Lovecraft, e se refere a um demônio que mata as pessoas durante o sono. O segundo nome é de uma divindade que Malefic retirou de um livro de uma religião afro-caribenha. Apesar de ter sido formada em 1995, foi em 2001 com o álbum "Nocturnal Poising" que a banda passou a ser associada com o Depressive Suicidal Black Metal, sendo este um dos álbuns essenciais do subgênero.

Paolo Bruno, da banda Thy Light, conta que nenhum selo nacional se interessou em lançar a demo Suici.De.pression, que foi gravada entre março e junho de 2007. Como ele acompanhava a banda Austere desde sua criação e mantinha certo contato com Desolate, veio a conhecer Sorrow também que logo ouviu a demo e gostou das músicas e, em seguida, a lançou através de seu selo musical, a Ruin Productions

Obehag (Fredrik), da banda Apati, faleceu no dia 23 de julho de 2011 devido a uma superdosagem não-intencional do medicamento Metadona (medicamento para dor grave e síndrome de abstinência a opioides). Cerca de um mês e meio depois, em 9 de setembro de 2011, morreu B (Jonas) da banda Lifelover, também devido a uma superdosagem, porém, ocorrida por vários medicamentos que ele usava para depressão e transtorno de ansiedade generalizada. Embora ambos morassem em cidades suecas diferentes (Vasteras e Estocolmo, respectivamente) com 115 km de distância, os dois ajudaram a fundar bandas que se tornaram muito importantes dentro do DSBM. Muitas vezes, elas são chamadas de "Narcotic Metal" pois as letras de ambas se concentraram em drogas ilícitas, medicamentos, bebidas alcoólicas e overdoses (ocasionadas obviamente pelo desespero dos transtornos mentais), também se focaram em mostrar a desolação urbana que cerca a fria e cinza Suécia (mas que pode representar o cotidiano de qualquer pessoa em qualquer lugar do planeta), autoagressão e relacionamentos interpessoais.

A. Morbid, fundador da banda Happy Days, não tinha os equipamentos necessários para fazer as gravações quando compôs suas primeiras canções, no ano de 2004. Foi apenas em 2007 que ele conseguiu alugar uma máquina de Karaokê infantil. Como haviam entradas para conectar dois microfones, ele usou uma para o microfone e plugou uma guitarra na outra. A bateria foi programada, mas ainda assim o tempo dos instrumentos não ficou sincronizado, sendo possível escutar a bateria fora do tempo em relação à guitarra e vocais. Para a primeira demo ele compôs e cantou as músicas no idioma norueguês, como uma espécie de homenagem às bandas e músicos da cena do Black Metal que ele curtia.

Andreas Rönnberg, da banda Intig, compôs a trilha sonora inteira do jogo Cry of Fear, produzido pela Team Psykskallar, empresa sueca desenvolvedora de games e mods que ele, inclusive, ajudou a fundar.

Hanging Garden foi fundada em 2008 e permaneceu ativa até 2012, lançou dois álbuns, um em 2009 e outro em 2011. A proposta da banda foi abordar as decepções, frustrações e rejeições presentes em relacionamentos amorosos, em suas letras. Embora outras bandas já tenham expressado esse tema em suas letras, a Hanging Garden se concentrava unicamente nele e todas as músicas carregam a melancolia que se instala após um rompimento amoroso.

Jacob Ottosson (145188), da banda Vanhelga, foi internado em instituições psiquiátricas por diversas vezes. Numa dessas vezes ele teve acesso a um computador dentro do hospital e começou a escrever resumidamente sua rotina lá dentro. Desse diário surgiram algumas músicas e ele as gravou no álbum LPT, em 2014. Na lei sueca existe uma decisão de que o estado tem poder e dever de cuidar de pessoas que sofram com transtorno mental. É chamado de Cuidado Compulsório de Pessoas com Problemas de Saúde Mental (LPT) os cuidados onde médicos tem total autonomia, enquanto as decisões sobre Cuidados Psiquiátricos Legais (LRV) são tomadas pelo tribunal.
No encarte do álbum tem a seguinte mensagem: "Esta criação é o resultado de um longo período de tempo hospitalizado sob a lei sueca chamada "LPT". Eu não tive liberdade alguma e a única coisa presente foi miséria e silêncio total. Todas as letras, músicas e arte de capa foram criadas durante esse período de isolamento porque tive sorte e acesso a um laptop.
A conclusão disso é; se você quiser ter uma ideia da ansiedade, miséria, depressão e da dor que ser trancado dentro de uma ala psiquiátrica fornece - ouça esta obra de arte".